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BRDE financiou mais de R$ 3 bi em meio à pandemia, diz presidente Leany Lemos

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A pandemia de Covid-19 gerou uma forte pressão sobre o Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE) para atender tanto ao crédito emergencial em momento de extrema dificuldade para os empreendedores quanto ao apoio a novos investimentos.Segundo a diretora-presidente do BRDE, Leany Lemos, apesar de todos os desafios e dificuldades de um ambiente de muita incerteza econômica e insegurança sanitária, o banco conseguiu cumprir a missão de apoiar e fomentar o desenvolvimento econômico e social da Região Sul.Em 2020, mais de R$ 3,3 bilhões em financiamentos foram operacionalizados por meio de seus programas de desenvolvimento no Rio Grande do Sul, em Santa Catarina e no Paraná.Leany, que assumiu o cargo em dezembro de 2020, foi a primeira mulher a presidir o BRDE em seus 60 anos de história. Entre as prioridades que colocou para sua gestão estão a diversificação das linhas de crédito do banco, ampliação das ações de captação e repasse de recursos a municípios e apoio às políticas públicas.Embora as perspectivas para 2021 ainda sejam de incertezas, a presidente do BRDE acredita que o Rio Grande do Sul deverá ter uma retomada econômica, puxada principalmente pelos bons resultados do agronegócio.Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, Leany fala das expectativas para o crédito aos empreendedores, do cenário financeiro e das ações do banco nos estados do Sul.

Jornal do Comércio – Como vê o cenário econômico em 2021?

Leany Lemos – O ano de 2020 foi bastante desafiador. Havia uma expectativa pior de PIB (Produto Interno Bruto) do que a que se realizou, e essa performance um pouco melhor se deveu a uma série de medidas que foram tomadas, como o auxílio emergencial, oferta de crédito, a renegociação de dívidas. Mas isso nos gera um desafio para 2021. Tivemos um resultado menos pior do que o esperado no ano passado graças a um gasto fiscal que, neste ano, a gente não consegue fazer. Houve uma aprovação de um orçamento que tem lacunas que afetam diretamente o crédito. Por exemplo, houve um corte de mais de R$ 2 bilhões em relação ao Plano Safra, o que nos afeta diretamente, porque o BRDE é operador das linhas para o agronegócio nos estados do Sul. Então, não sabemos que nível de despesa vai poder ser feito pelo governo, especialmente do ponto de vista de medidas mitigadoras da pandemia de Covid-19, especialmente com impacto fiscal direto, como foi o caso do auxílio emergencial, que sabemos que está vindo, mas em um valor menor. Então, algumas variáveis ainda têm que ser esclarecidas para saber como será a decisão dos empreendedores de investir ou não.

JC – Quais setores devem ter maior demanda por crédito?

Leany – No Rio Grande do Sul, neste ano, temos uma expectativa de ter cerca de R$ 400 milhões contratados na agricultura, e de R$ 150 milhões a R$ 200 milhões na indústria, além de outros R$ 100 milhões para municípios. Em 2020, o PIB brasileiro teve recessão de 4,1%, e o gaúcho caiu 7% por causa da estiagem e todo efeito que teve na cadeia do agronegócio. Neste ano, esse setor terá um efeito muito positivo. Teremos uma ótima safra, e o preço da soja está em recorde histórico. Claro, no crédito agrícola existe uma incerteza sobre os recursos para o Plano Safra no segundo semestre. Mas existe apetite por crédito, com uma boa safra e com esse preço dos grãos, existe demanda forte de potenciais clientes, como cooperativas, que estão entre os principais clientes do BRDE. Temos uma expectativa de aumento de investimentos, por exemplo, em armazenagem, em transporte, em processamento de produção, em agroindústria. Então existe um bom cenário, mas precisamos de uma solução para a questão do Plano Safra, que subsidia os juros para as atividades da agricultura. Mas vemos algumas oportunidades. A indústria está se recuperando bem. No comércio e serviços, algumas áreas, voltadas muito para entretenimento, como bares, restaurantes e turismo, sofrem um impacto maior com a pandemia, e terão mais dificuldades de investimento. Mas outras cadeias têm uma demanda por crédito que continua acontecendo. Uma delas é a energia, por exemplo. Com a privatização da CEEE, deve haver um apetite maior por crédito, porque as empresas que adquirem as operações precisam investir para executar aquilo que está contratado. Agora, foi feita a da distribuição e, em seguida, vai vir da geração, inclusive com volumes de investimento fortes e demanda por crédito em valores altos.

JC – O BRDE pretende financiar os compradores das operações da CEEE?

Leany – Estamos aí para conversar com quem quiser investir nessa área de energia. Queremos nos fortalecer em projetos com alto impacto em indicadores ambientais, sociais, de desenvolvimento sustentável. Por isso, energias renováveis e eficiência energética são projetos que são bastante relevantes para o banco. No ano passado, tivemos mais de R$ 400 milhões em operações contratadas só nas áreas de eficiência energética e energia renovável.

JC – O ambiente político no Estado está favorecendo os investimentos?

Leany – Acho que estamos num momento, especialmente no Rio Grande do Sul, com uma política fiscal robusta, que poderá ter efeitos muito positivos na economia aqui no médio prazo. Isso gera atração de mais investimentos, e o BRDE está aí como parceiro também para financiar quem quiser investir.

JC – O aumento dos juros não pode retrair a tomada de crédito?

Leany – Juros mais altos acabam inibindo a contratação de investimentos. No entanto, o Brasil tem, historicamente, taxas de juros mais altas do que os outros países emergentes, e isso não impediu que houvesse alguma taxa de investimento. Essa decisão do investidor é mais complexa. Obviamente, ela leva em conta essa taxa, mas também as oportunidades de negócio e de realização de lucros. Por exemplo, se seu produto está inserido no comércio global, e está com valores altos, com o câmbio valorizado, um juro maior não retira as vantagens para o exportador. Tudo depende muito do setor e de outras condições. Para a Região Sul, especialmente para o Rio Grande do Sul, temos uma expectativa muito positiva. De um lado, um crescimento do PIB pelo resultado da safra agrícola e pelo preço das commodities. Já há uma recuperação da pandemia, ainda que haja toda essa incerteza sobre a vacinação, mas temos uma expectativa de melhora ou de retomada maior no segundo semestre. A grande questão que fica ainda, do ponto de vista regional e nacional, é o desafio fiscal, a questão das contas públicas, especialmente a dívida pública, que, no Brasil, atingiu mais de 90% do PIB, e como isso impacta as decisões dos investidores.

JC – Os investidores deverão ficar mais cautelosos?

Leany – Há uma cautela, que é natural, porque as incertezas ainda estão aí na mesa, principalmente por causa da pandemia. Quando o presidente do Banco Central ou o ministro da Economia vão fazer uma palestra e falam de vacinação, você vê o quanto que essa crise sanitária e a solução para ela são relevantes para a retomada do crescimento econômico. O Brasil está na lanterninha do crescimento econômico. É muito frustrante, porque os países emergentes estão com expectativa de crescer acima de 6%, e o Brasil está comemorando que vai crescer um pouco mais de 3%. Para o Rio Grande do Sul, diria que temos uma expectativa muito positiva de crescimento, por causa da safra agrícola, com forte recuperação das perdas da estiagem de 2020.

JC – As expectativas do mercado estariam melhores se o governo tivesse dado mais segurança na questão da vacinação?

Leany – Acredito que sim. Por mais incerteza que haja, a priorização da imunidade da população permite um retorno às atividades econômicas com maior qualidade. A questão da vacinação hoje é essencial para uma retomada não só das atividades, mas uma retomada de investimentos.

JC – O lucro líquido do banco em 2020, que foi de R$ 199,3 milhões, representa uma queda de 28,3% ante 2019. Diante do cenário econômico desafiador, foi um resultado positivo?

Leany – Essa queda foi em relação à 2019, que foi nosso melhor ano de resultado na história. Mesmo com a perda, 2020 foi o nosso terceiro melhor ano. Por que foi um ano tão positivo? Em primeiro lugar, foram feitas várias renegociações de dívida. Para ter uma ideia, 25% da nossa carteira foi renegociada. O banco aderiu ao standstill (suspensão de pagamentos) imediatamente, e a gente teve uma renegociação dos contratos. Isso deu conforto aos clientes para que eles pudessem atravessar esse pior momento. Isso também garantiu ao banco que fechasse um ano com inadimplência muito baixa, 0,32% em dezembro, um mínimo histórico. O BRDE tem uma taxa de inadimplência muito menor do que os bancos públicos (1,95%) e que os privados (2,26%). Mas, além de um lucro significativo, tivemos um aporte de capital de R$ 85 milhões e um conjunto forte de contratações, que eu acho que é o mais relevante, uma vez que a missão do grupo é fomentar o empreendedorismo e oferecer crédito para projetos. Foram R$ 3,3 bilhões contratados nos três estados do Sul, sendo que R$ 851 milhões foram de recursos próprios utilizados no programa Recupera Sul, que basicamente é capital de giro. O BRDE é um banco de projeto, um banco de desenvolvimento, ele não empresta capital de giro. No entanto, dada a situação da pandemia no ano passado, houve um entendimento de que era necessário ter crédito. Em pesquisa recente feita com lojistas em relação ao que eles querem para passar a crise, 47% disseram querer capital de giro. Também foi importante o nosso PCS (Programa de Consumo e Produção Sustentável), que foi por volta de R$ 500 milhões, cerca de 17% da nossa carteira, e 80% desse valor foi para energia renovável e eficiência energética, mas também para trabalhos com agricultura de baixo carbono, uso renovável da água e tratamento de resíduos sólidos.

JC – O foco de atuação do BRDE são os três estados da região Sul (RS, SC e PR), que são seus controladores. Há diferença na reativação da economia entre os estados?

Leany – Diria que estão em compasso. Os três estados têm características muito semelhantes, com economias parecidas. O que a gente vê que tem uma escala bem grande são as cooperativas do Paraná. Elas têm crescido, faturado valores muito significativos. Santa Catarina tem uma característica de conseguir pulverizar muito o seu recurso entre os municípios. E o Rio Grande do Sul tem um pouco de tudo, tem um agro potente, e temos excelentes operações na região da Serra, especialmente projetos na área de inovação tecnológica. Aqui existe um ecossistema muito forte de inovação, onde investimos com o programa Inova BRDE e com a aceleração de startups e “capital anjo”.

JC – O BRDE também tem investido em ações sociais. Quais os segmentos em que está mais atuante?

Leany – Estamos fortalecendo todas as políticas que tínhamos, mas também começamos a atuar em algumas frentes um pouco mais específicas. Uma delas, no Rio Grande do Sul, foi a economia criativa, que abrange nove setores diferentes, como patrimônio cultural, moda, design, gastronomia, entre outros. Já temos mais de R$ 14 milhões aprovados em operações para restaurantes e bares, um setor que foi duramente atingido pela pandemia. Como fizemos isso? Reduzimos o nosso valor mínimo para atendimento direto na agência e, com isso, a conseguimos oferecer taxas muito atrativas, mais baixas comparadas do que as que existem e são praticadas no mercado. Outra ação foi para o empreendedorismo feminino, uma pauta que era óbvia para mim, sendo a primeira mulher a presidir o banco em seus 60 anos de história. Hoje, quando a gente discute sustentabilidade, eficiência e governança, esse tema de gênero está em cima da lista do que é relevante. Existe uma lacuna mundial de crédito para as mulheres. Então, desenhamos um programa, lançado agora em 2021, em que reduzimos taxas de avaliação, de fiscalização, e um pouco do spread do banco para atender a empreendedoras. Esse crédito facilitado está disponível para mulheres que têm pelo menos 50% da participação no capital social de uma empresa. Então, se ela tem 50%, ela é dona do negócio e pode tomar esse crédito. O empoderamento financeiro das mulheres é relevante para o desenvolvimento da sociedade.

Perfil

Nascida em 6 de abril de 1970, em Brasília, Leany Barreiro de Sousa Lemos possui quase 30 anos no serviço público. Graduada em Letras pela Universidade de Brasília (UnB) em 1992, foi aprovada, em 1993, no concurso de técnica legislativa do Senado. Mestre em Ciência Política (1998) e doutora em Estudos Comparativos das Américas (2005) pela UnB, tem pós-doutorado no programa Oxford-Princeton Global Leaders (2009-2011). É professora do mestrado em Gestão Pública no Instituto de Direito Público desde 2017. Em 2013, foi nomeada chefe de gabinete do senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF). Com a eleição dele ao governo Distrito Federal, em 2015, Leany se tornou secretária distrital do Planejamento. Em 2018, foi escolhida como primeira suplente da senadora Leila Barros (PSB-DF). Após as eleições daquele ano, aceitou o convite do governador Eduardo Leite (PSDB) para ser a secretária do Planejamento. Deixou a pasta em maio de 2020 para coordenar o Comitê de Dados da Covid-19 e integrar o Gabinete de Crise da pandemia. Foi indicada a uma das diretorias do BRDE e assumiu a presidência do banco no fim do ano passado.

Fonte: Jornal do Comércio

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